O
sol atravessava uma nuvem naquela quarta-feira já com aspecto de tumulto devido
à proximidade do Dia de Todos os Santos. Tudo parecia funcionar conforme a
trama da rotina: as mulheres sacodem os tapetes nas janelas, os homens se
lançam rumo aos seus afazeres... E ali um monge sobe as escadas da Igreja do
Castelo de Wittenberg. Vai a mais uma incontável ladainha? Não! Vê-se uma
determinação silenciosa. Fixa uns papeis na porta ao lado da Igreja. Mais um papel nesse mural de pedidos de orações e avisos? O vento
sobra: vento que se remete contra a porta da Igreja e arranca os papeis
jogando-os ao esquecimento. Não dessa vez! Ali estava afixado papéis com
escritos para suportarem tempestades. ‘‘Vejam!’’, exclama alguém. O Dr.
Martinho Lutero deixou algo na porta da Igreja. Correm para ver o que estava
escrito. O texto em latim. Os que observam não sabem a língua da academia e dos
clérigos. Finalmente, um alfabetizado na sacra língua faz a leitura. Ali o eco
das 95 teses é como se um terremoto abalasse o mundo. ‘‘É necessário que todos
leiam!’’, sugestiona alguém. Encarregam de levar à mais próxima imprensa.
O sol resiste em se pôr. Esse é
um dia eterno! Ele não poderia ser medido com qualquer ampulheta. O selo do
Livro escrito por dentro e por fora rompeu-se. O Evangelho eterno sopra entre
aquelas campinas e enche as velas da profecia bíblica. O tempo está cumprido. O
que previra o profeta Habacuque (2.4) quebra os grilhões da crendice, dos
dogmas e da soberba, e ecoa: ‘‘O justo viverá por fé’’. Nas pegadas daquele
monge, agora corria a história da salvação. Desencadeava-se a revolução da
maravilhosa graça. Os reis, rainhas, sábios ou demônios não seriam capazes de
deter o jorrar do rio que corre do trono de Deus!
O sol encontra-se em seu ocaso. O
monge já voltara ao seu convento. Nem imagina que lá fora o mundo não é mais o
mesmo. Ele senta e faz sua oração vespertina. Agradece a Deus por sua bondade e
se prepara para o anoitecer. Não sabe ele que, na verdade, encontra-se em outro
tempo: o sol ainda está no crepúsculo. Post tenebras lux - após as trevas, a
luz! Não está anoitecendo, mas amanhecendo. A luz do Evangelho da graça e da
glória de Deus brilha novamente!
A noite chega. O monge dorme sob
a proteção divina. Durante a noite, suas palavras tornam-se folhas voadoras
(panfletos). Ao amanhecer o mundo receberia não apenas uma denúncia contra a
venda de indulgências, mas o Evangelho salvador de Deus!
Que maravilhoso dia o Senhor fez.
Alegremo-nos e regozijemo-nos nele! A graça superabundava. Era 31 de outubro de
1517. O início do retorno ao Evangelho: a Era Protestante!
Rev. J. A. Lucas
Guimarães
Secretário Executivo/PRST